Transporte

A INSEGURANÇA no transporte coletivo por ônibus na cidade de SÃO PAULO

Por Engº Ricardo Ribeiro – É Com Você

Caros leitores e leitoras,

Dia Mundial da Segurança e Saúde no Trabalho de 2023 é comemorado em 28 de abril de 2023 e aborda o tema: “Um Ambiente de Trabalho Seguro e Saudável como Princípio Fundamental e Direito no Trabalho. (veja por que o dia 28/abril foi escolhido pela ONU, clique aqui)

Em junho de 2022, a Conferência Internacional do Trabalho (ILC) decidiu incluir “Um Ambiente de Trabalho Seguro e Saudável “, no quadro de princípios e direitos fundamentais no trabalho da OIT (Organização Internacional do Trabalho). Nesta ocasião, a Convenção sobre Segurança e Saúde Ocupacional nº 155, e a Convenção do Painel Promocional para Segurança e Saúde Ocupacional nº 187, foram declaradas convenções fundamentais.

Como resultado desta decisão, todos os Estados Membros, mesmo que não tenham ratificado as Convenções em questão, têm a obrigação, decorrente do próprio fato de pertencer à Organização, de respeitar, promover e realizar, de boa fé e de acordo com a Constituição, os princípios relativos aos direitos fundamentais que são objeto dessas Convenções.

Ao encontro do tema definido pela OIT, vamos falar sobre os acidentes envolvendo os ônibus que realizam o transporte coletivo na capital paulista, ocorridos em 2023.

O gráfico seguinte mostra a evolução dos acidentes de 2018 a 2023, exceto 2022 que ainda está sendo apurado pelo órgão responsável:

Observem que há uma queda ao longo do período, mas, um número elevado de ocorrências no ano. Veja na cidade de Belo Horizonte:

A quantidade de feridos é quase equivalente, entretanto, o número de óbitos é bem inferior em Belo Horizonte.

Em São Paulo, a empresa SPTrans é responsável pela gestão do sistema de transporte público de passageiros da cidade, realizado por ônibus.

Em contato com a assessoria de imprensa, recebemos a informação de que “A SPTrans anunciou no último dia 4 de abril um novo programa de treinamento obrigatório para motoristas de ônibus na cidade de São Paulo com o objetivo de reduzir os sinistros de trânsito envolvendo os coletivos municipais. As informações estão disponíveis em https://www.sptrans.com.br/noticias/sptrans-determina-novo-treinamento-de-seguranca-a-todos-os-motoristas-de-onibus-da-cidade/ .

A SPTrans também conta com “Programa de Redução de Acidentes em Transportes (PRAT) foi criado em 2007 com o objetivo de analisar a conduta de motoristas envolvidos em sinistros. Todos os casos envolvendo vítimas são analisados e quando verificado que o condutor não seguiu os conceitos de direção defensiva, ele é suspenso de suas atividades e bloqueado no cadastro de operadores. Um condutor afastado somente pode retornar às atividades após a comprovação de que realizou novo Curso de Direção Defensiva, com carga horária mínima de oito horas, além de apresentar exame de sanidade física e mental. Todos os documentos devem ter data posterior à da ocorrência. Ainda que ele seja demitido pela concessionária, ele só poderá retornar ao sistema em outra empresa, após seguir estes passos.

Segundo a SPTrans, 7 funcionários que passam por um treinamento específico com objetivo de analisar as ocorrências “Com Toda Justiça e Correção”. A análise realizada considera se o motorista dirigia defensivamente no momento da ocorrência, ou seja, se poderia evitar ou, pelo menos, minimizar a gravidade do sinistro.

Perguntamos se, a SPTrans realiza Auditoria de Segurança nas Empresas e, se sim, qual a periodicidade. Resposta: “A SPTrans realiza auditoria técnica dos processos de manutenção da frota vinculada ao Sistema de Transporte, e também, dos Organismos de Inspeção Acreditados pelo INMETRO – OIA’s referente à frota dos serviços autorizados.

Na sequência, perguntamos quais as exigências contratuais a SPTrans prevê para que a empresa adote os procedimentos de Segurança e Saúde no Trabalho. Resposta: “Os Certificados exigidos pelos contratos de concessão são: Certificação do Sistema de Gestão da Qualidade – NBR ISO 9001, Certificação do Sistemas de Gestão da Segurança Viária – NBR ISO 39001 e Certificação do Sistema de Gestão Ambiental – NBR ISO 14001.

Realizamos uma pesquisa nos sites das 24 concessionárias que prestam o serviço na cidade de São Paulo e, somente 3 empresas declaram possuir a certificação ISO-39001. Lembrando que se trata de uma exigência contratual. Veja o gráfico abaixo:

Cabe ressaltar, que a ISO-39001:2015 é importante, mas, não abrange os requisitos relacionados à Segurança e Saúde no Trabalho, ou seja, não visa estabelecer uma Cultura de Segurança junto a todos os funcionários da organização, incluindo os motoristas.

Cabe destacar que entramos em contato com cada uma das empresas e enviamos um questionário com foco na Segurança do Trabalho e nenhuma das empresas respondeu. Inclusive enviamos perguntas ao Sindmotoristas que, também, não se manifestou.

Ou seja, com as informações que levantamos, a SPTrans não possui nenhum mecanismo de controle e/ou fiscalização sobre de que forma as 24 empresas que prestam serviço na cidade de São Paulo estão lidando com a Segurança e Saúde no Trabalho.

Observem, no gráfico abaixo, os acidentes em 2023 computados até 10/05/2023:

Ou seja, mais da metade das 24 empresas se envolveram em acidentes em 2023:

Diante do acima exposto, podemos concluir que a SPTrans não possui nenhum mecanismo de controle e/ou fiscalização sobre de que forma as 24 empresas que prestam serviço na cidade de São Paulo estão lidando com a Segurança e Saúde no Trabalho.

Cabe destacar que entramos em contato com cada uma das 24 empresas e enviamos um questionário com foco na Segurança do Trabalho e nenhuma das empresas respondeu. Inclusive enviamos perguntas ao Sindmotoristas que, também, não se manifestou.

Buscamos alguns estudos realizados por pesquisadores, com objetivo de subsidiar nosso entendimento quando se trata de fatores de estresse ocupacional a que estão submetidos os motoristas de ônibus.

De acordo com MARTINS (2014) a Escala dos Principais Estressores, dentre os 30 indicadores, as situações consideradas mais estressantes pelos motoristas que possuem e os que não possuem sintomas de estresse, estão no gráfico a seguir.

O gráfico revela que a preocupação com os idososdefeitos no veículodeficientes físicos e medo de cometer infrações é maior para os motoristas sem sintomas de estresse.

Entretanto, observem que todas as situações relatadas como estressantes, são as que ocasionaram os acidentes envolvendo ônibus agora em 2023. Isto significa que, se o motorista recebesse um treinamento adequado, essas situações não seriam consideradas estressantes e sim tratadas com a devida atenção pelo motorista, seja com o veículo parado ou em movimento.

Em outro estudo, SOUZA (2016) traz outra situação deixam os motoristas mais irritados no exercício da profissão que é a dupla função (motorista e cobrador)

Ressaltamos que as tarefas do cobrador vão além da cobrança da passagem. O Sindicato dos Rodoviários de Mogi das Cruzes elencou algumas das tarefas que os cobradores realizam e que são fundamentais para a Segurança de todos, vejam:

  • O cobrador auxilia e opera o elevador do cadeirante, item de acessibilidade no ônibus.
  • O cobrador fornece informações sobre endereço, localidade, e destino aos passageiros quando perguntado, não tirando assim a atenção do motorista.
  • O cobrador orienta o usuário a usar o validador e fornece troco àquele que não tem cartão.
  • O cobrador auxilia a qualquer usuário que venha a passar mal no interior do veículo.
  • O cobrador e o motorista zelam pela manutenção e organização do ônibus qualquer eventualidade que vier a ocorrer no interior do ônibus.
  • O cobrador proporciona maior agilidade nas saídas de pontos lotados nos horários de pico.
  • O cobrador auxilia o motorista no trânsito como, manobras, ajuste no retrovisor e até mesmo no itinerário.
  • O cobrador é uma testemunha ocular e facilita a relação de possível B.O de fatos inusitados. (assaltos, brigas, discussões etc.)
  • O cobrador colabora com a segurança evitando que o motorista seja incomodado durante o percurso, prestando atenção somente no trânsito.
  • O cobrador auxilia no embarque e desembarque com segurança dos passageiros, evitando assim, que o motorista desvie sua atenção do trânsito.

Com relação à prevenção do estresse, recomendamos o Guia “Motoristas de Ônibus: estresse ocupacional e prevenção do estresse”, onde KOMPIER (1996) aponta três estratégias básicas em ordem de preferência:

  1. Elimine ou modifique a situação geradora de estresse ou remova o indivíduo dela.
  2. Adaptar a organização do trabalho e o posto de trabalho às características individuais do empregado.
  3. Fortalecer a resiliência da pessoa ao estresse, por exemplo, por meio de exercícios físicos, meditação ou técnicas de relaxamento e apoio social.

Segundo KOMPIER (1996), O gerenciamento do estresse tradicionalmente se concentra em abordagens individuais, geralmente aconselhando indivíduos ou pequenos grupos de funcionários sobre maneiras de se adaptar ou lidar com vários estressores ocupacionais e/ou suas consequências.

Um exemplo dessa abordagem é a Diretiva da União Europeia sobre saúde e segurança. A Diretiva estabelece, entre outros, que o empregador tem o dever de garantir a segurança e a saúde dos trabalhadores em todos os aspectos relacionados ao trabalho, seguindo os princípios gerais de prevenção: evitar riscos; avaliando os riscos que não podem ser evitados; combater os riscos na fonte; a adaptação do trabalho ao indivíduo, especialmente no que diz respeito à concepção dos locais de trabalho; a escolha do equipamento de trabalho e, a escolha dos métodos de trabalho e produção, com vista a atenuar o trabalho monótono a ritmo predeterminado e, a reduzir os seus efeitos na saúde. (no Brasil – NR-1 – Disposições Gerais e Gerenciamento de Riscos Ocupacionais).

Com objetivo de contribuir com redução das ocorrências, relacionamos abaixo algumas das boas-práticas visando o aprimoramento da Segurança e Saúde no Trabalho das empresas de ônibus na cidade de São Paulo.

Boas-Práticas recomendadas à SPTrans:

  • Exigir a Certificação ISO 45001 Sistema de Gestão da Saúde e Segurança Ocupacional (SGSSO) ou OSHAS 18001;
  • Realizar auditorias (interna e externa) do Sistema de Gestão da Saúde e Segurança Ocupacional;
  • Exigir das empresas a implantação de processos de avaliação do ambiente de trabalho;
  • Exigir das empresas a realização de preleções (diárias) de Saúde e Segurança do Trabalho para os funcionários;
  • Exigir das empresas a implantação de programa de suporte psicológico para os funcionários;
  • Fiscalizar a carga horária de trabalho dos motoristas;
  • Exigir que cada empresa tenha um setor específico de Saúde e Segurança do Trabalho;
  • Exigir das empresas a implantação de uma Política Integradaque deixe explícito o compromisso da alta direção com a Saúde e a Segurança do Trabalho.
  • Exigir mecanismos de controle e registros das ocorrências e dos incidentes e acidentes;
  • Exigir das empresas que mantenham funcionando adequadamente os canais de atendimento aos clientes (SAC).

Leitores e leitoras, caso VOCÊ presencie alguma irregularidade e/ou alguma situação de risco quando estiver utilizando os ônibus em sua cidade, registre junto à empresa responsável e aos órgãos de fiscalização.

Agora É Com Você! (compartilhe com seus amigos e familiares)

Abraços.

Engº. Ricardo Ribeiro.

 

Literatura consultada:

Nível de estresse e principais estressores do motorista de transporte coletivo – Franciele de Fraga MARTINS, Regina Maria Fernandes Lopes e Marianne Farina – (Univ. Luterana do Brasil e Pontifícia Universidade Católica) – Bol. Acad. Paulista de Psicologia, São Paulo, Brasil – V. 34, no 87, p. 523-536.

Motorista de ônibus – o estresse na profissão – Fundação Dom Cabral – Serviço Social do Transporte – Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (SENAT) – Marcelo Barros de SOUZA et al.

Motoristas de ônibus: estresse ocupacional e prevenção do estresse – Professor M.A.J. KOMPIER – Departamento de Psicologia Organizacional e do Trabalho – Universidade de Nijmegen – 1996.

As convenções fundamentais sobre segurança e saúde ocupacional | The Fundamental conventions on occupational safety and health | The Fundamental conventions on occupational safety and health (ilo.org) 

Texto consolidado: Diretiva do Conselho de 12 de junho de 1989 relativa à introdução de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde dos trabalhadores no trabalho (89/391/CEE) | Consolidated text: Council Directive of 12 June 1989 on the introduction of measures to encourage improvements in the safety and health of workers at work (89/391/EEC) | EUR-Lex – 01989L0391-20081211 – EN – EUR-Lex (europa.eu) 

Imagens: Divulgação

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